A multa por atraso na escrituração fiscal digital – EFD é confiscatória, por falta de razoabilidade e ferir outros princípios

Por Natal Moro Frigi

Ao falarmos em justiça fiscal ou por alguns, conhecida como justiça tributária, não podemos tão somente em pensar em tributação compatível com capacidade contributiva do contribuinte, estamos a falar também para a impossibilidade do fisco em adentrar ao patrimônio do contribuinte através de multas fiscais.

O Estado, no caso em apreço, a UNIÃO, através da RFB – Receita Federal do Brasil tem a obrigação de fiscalizar, e ao fiscalizar de agir com inteira probidade. Partindo-se do termo probidade, que é: Observância rigorosa dos deveres, da justiça e da moral = honradez.

Mesmo que a RFB aplique rigorosamente o que prevê a lei, estaria tendo honradez em aplicar multas que extrapolam em muitos casos o faturamento e até mesmo o valor patrimonial do contribuinte? Como é o caso da multa por atraso na escrituração fiscal digital, objeto do presente!

O Sped – Sistema Público de Escrituração Digital foi instituído pelo Decreto nº 6.022/2007. O interesse da instituição do Sped é a integração entre os fiscos Federal, Estadual e Municipal, racionalizando as obrigações acessórias, tornando mais célere a identificação de ilícitos fiscais.

A Emenda Constitucional nº 42, aprovada aos 19 de dezembro de 2003, introduziu o inciso XXII ao art. 37 da Constituição Federal, determinando às administrações tributárias da União, dos Estados e dos Municípios à atuarem de forma integrada, inclusive com compartilhamento de cadastros e de informações fiscais.

Eis que podemos concluir que a exigência da EFD somente tende a ser mais cerrada, com mais exigências, vejamos o art. 3º e incisos do Decreto nº 6.022/2003:

“Art. 3º São usuários do Sped:
I – a Secretaria da Receita Federal do Ministério da Fazenda;
II – as administrações tributárias dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, mediante convênio celebrado com a Secretaria da Receita Federal; e
III – os órgãos e as entidades da administração pública federal direta e indireta que tenham atribuição legal de regulação, normatização, controle e fiscalização dos empresários e das sociedades empresárias.
§ 1º Os usuários de que trata o caput, no âmbito de suas respectivas competências, deverão estabelecer a obrigatoriedade, periodicidade e prazos de apresentação dos livros e documentos, por eles exigidos, por intermédio do Sped.
§ 2º Os atos administrativos expedidos em observância ao disposto no § 1º deverão ser implementados no Sped concomitantemente com a entrada em vigor desses atos.
§ 3º O disposto no § 1º não exclui a competência dos usuários ali mencionados de exigir, a qualquer tempo, informações adicionais necessárias ao desempenho de suas atribuições” (01).

I – Da multa estabelecido por atraso no envio da EFD – Escrituração Fiscal Digital

A Instrução Normativa RFB nº 1.052/2010 instituiu a escrituração digital da Contribuição para o Pis/Pasep e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social – Cofins, e com várias alterações, IN RFB nº 1.085/2010, IN RFB nº 1.161/2011, IN RFB nº 1.218/2011 e revogado pela Instrução Normativa RFB nº 1.252/2012.

O emaranhado de normas acaba por dificultar ainda mais o entendimento quanto à escrituração digital. No que tange à penalidade no caso do contribuinte atrasar o envio de sua escrituração, será penalizado com altíssima multa, conforme art. 10 da IN 1.252/2012:

“Art. 10. A não apresentação da EFD-Contribuições no prazo fixado no art. 7º acarretará a aplicação de multa no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) por mês-calendário ou fração. (Vide art. 1º do ADE RFB nº 4, 2012)” (02).

Não há como justificar a descabida sanção, sem antes abordarmos o princípio da moralidade administrativa, do direito à razoabilidade, à propriedade, da vedação ao confisco e da capacidade contributiva.

II – Princípio da moralidade administrativa

Esse princípio tem por objetivo mostrar que o Estado deve agir sempre em conformidade com a moralidade, princípio este descrito em nossa Constituição:

“Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)” (03).

Princípio não menos importante que os demais, como explica José dos Santos Carvalho Filho:

“A Constituição referiu-se expressamente ao princípio da moralidade no art. 37, caput. Embora o conteúdo da moralidade seja diverso da legalidade, o fato é que aquele esta normalmente associado a este. Em algumas ocasiões, a imoralidade consiste na ofensa direta à lei e aí violará, ipso facto, o princípio da legalidade. Em outras, residirá no tratamento discricionário, positivo ou negativo, dispensado ao administrado; nesse caso, vulnerado estará o princípio da impessoalidade, requisito, em ultima análise, da legalidade da conduta administrativa” (04).

Contribuindo com os ensinamentos anteriores, Alexandre de Barros Castro, leciona:

“Constitui tal princípio pressuposto de validade de todo ato administrativo. Não se trata de moral comum, mas, sim, de uma moral jurídica, entendida aqui como um conjunto de regras de conduta e de procedimentos a que o Poder Público deve obedecer. Ou seja, tal preceito reza pelo bom e fiel cumprimento das regras de boa administração, que visam, em ultima instância, disciplinar o exercício do poder discricionário por parte da Administração Pública. É inegável que a moralidade administrativa integra o direito como elemento indissociável na sua aplicação, e em assim sendo, é inquestionável que também deve o Poder Público pautar sua atuação, quando do procedimento administrativo tributário” (05).

Pelo princípio da moralidade administrativa, o administrativo deve seguir rigorosamente os princípios éticos de razoabilidade e justiça. Odete Medauar, acentua:

“O princípio da moralidade é de difícil ou até impossível expressão verbal, na forma escrita ou oral. O problema de conceituação do princípio da moralidade está intimamente relacionado com a dificuldade de definição do termo corrupção” (06).

Analisando o presente princípio e a as normas pertinentes à EFD – Escrituração Fiscal Digital, chegaremos à conclusão de que mesmo estando o fisco, no caso a RFB – Receita Federal do Brasil amparada em norma para aplicação de sanção, esta ferindo o princípio em apreço, a da capacidade contributiva, do não confisco e da propriedade.

Manoel Gonçalves Filho aponta a dificuldade da conceituação de corrupção, enquanto desvio de conduta aberrante em relação ao padrão moral consagrado pela comunidade, exemplificando:

“Certos grupos, por exemplo, os profissionais liberais, costumam ser mais rigorosos em considerar certos atos como corruptos, do que outros menos moralistas. Isso faz com que, por exemplo, o Ministério Público, no Brasil, persiga como corrupção o nepotismo, que para a maioria da população é um dever do homem público, como bom chefe de família” (07).

III – Do direito à razoabilidade

No que tange ao principio da razoabilidade, este claramente esta com suas raízes fincadas no princípio da legalidade. Embora a penalidade em apreço esteja respaldada em leia, a forma pela qual se aplica não me parece nada razoável.

O princípio da razoabilidade estabelece ao ente arrecadador de que estando este amparado por lei, deve ser razoável em suas aplicações das legislações. Não é razoável a aplicação de multa inicial de R$ 5.000,00 (Cinco Mil Reais) a uma empresa que tem um faturamento mensal de R$ 3.000,00 (Três Mil Reais). Ressalta-se que o mencionado valor inicial da sanção é para cada mês ou fração em atraso.

Ainda contribuindo com este princípio, Celso Antônio Bandeira de Mello leciona:

“Não se imagine que a correção judicial baseada na violação do princípio da razoabilidade invade o mérito do ato administrativo, isto é, o campo de liberdade conferido pela lei à Administração para decidir-se segundo uma estimativa da situação e critérios de conveniência e oportunidade. Tal não ocorre porque a sobredita liberdade é liberdade dentro da lei, vale dizer, segundo as possibilidades nela comportadas. Uma providência desarrazoada, consoante dito, não pode ser havida como comportada pela lei. Logo, é ilegal: é desbordante dos limites nela admitidos” (08).

Contribuindo para o princípio da razoabilidade, Eduardo de Moraes Sabbag nos presta a seguinte lição:

“A razoabilidade é conceito jurídico indeterminado e elástico, podendo variar no tempo e espaço. Como o próprio termo prenuncia, o ser “razoável” significa atuar com bom senso e moderação, ponderando com equilíbrio as circunstâncias que envolvam a prática do ato.
A razoabilidade na ação estatal justifica-se na vinculação de ações coerentes, que levam em conta o equilíbrio no binômio “meios empregados e fins alcançáveis”. O princípio vem moldar a conduta da Administração, que, atuando com a racionalidade necessária, adotará critérios aceitáveis por qualquer pessoa equilibrada, afastando-se das condutas desarrazoadas e bizarras que se distanciam das finalidades da lei atributiva da discrição manejada. Em resumo, o princípio da razoabilidade, em harmônico convício com o postulado da proporcionalidade, apresenta-se no cenário em que excessos e atitudes incongruentes é defeso à Administração, disposta a homenagear a prudência no nobre exercício da função estatal” (09).

IV – Princípio do direito à propriedade

Em nossa Magna Carta no caput do art. 5º há previsão do direito e proteção à propriedade.

“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes (10).

Toda pessoa física ou jurídica, tem direito à propriedade, podendo o ordenamento jurídico estabelecer suas modalidades de aquisição, perda, uso e limites.

O direito de propriedade constitucionalmente consagrado, garante que dela ninguém poderá ser privado arbitrariamente, pois somente a necessidade, a utilidade pública ou o interesse social permitirão a desapropriação.

Neste contesto de propriedade não estar-se dizendo tão somente à propriedade “imóvel”, mas sim no sentido amplo de propriedade, sentido este que abrange todo direito à propriedade, podendo ser imóvel ou móvel.

Respeitada a função social do imóvel, este deve também estar protegido de arbitrariedades do Estado, não sofrendo através de sanções fiscais, e novamente aplicando-se esta proteção no sentido amplo de direito à propriedade, vejamos o que diz Alexandre de Moraes:

“A referência constitucional à função social como elemento estrutural da definição do direito à propriedade privada e da limitação legal de seu conteúdo demonstra a substituição de uma concepção abstrata de âmbito meramente subjetivo de livre domínio e disposição da propriedade por uma concepção social de propriedade privada, reforçada pela existência de um conjunto de obrigações para com os interesses da coletividade, visando também à finalidade ou utilidade social que cada categoria de bens objeto de domínio deve cumprir” (11).

O fisco ao aplicar sanção ao contribuinte e que passa à restringir o uso da propriedade, no caso de uma multa de ofício por atraso no envio da escrituração digital, está o fisco com esta atitude infringindo o princípio da garantia à propriedade privada. Vejas o que nos ensina Hugo de Brito Machado:

“Nossa Constituição Federal, ao cuidar dos princípios gerais da atividade econômica, determina seja observado, entre outros, o princípio da propriedade privada. E com isso justificou a existência do tributo, pois um Estado onde a ordem econômica adota o princípio da propriedade não pode, em regra, deter a propriedade dos meios de produção e valer-se do instrumento jurídico necessário a operar a transferência de recursos financeiros do setor privado para os cofres públicos” (12).

V – Princípio do não confisco

O princípio da vedação ao confisco esta previsto no art. 150, inciso IV da Constituição Federal, vejamos:

“Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
IV – utilizar tributo com efeito de confisco” (13).

Em linhas gerais estaremos diante do confisco, sempre que o contribuinte perde um bem em benefício ao fisco, sendo em via administrativa ou judicial sem a devida reparação cabível. Segue breve lição de Alexandre de Moraes:

“Confisco é palavra procedente do latim confiscatio, de confiscare. É ato de apreensão ou adjudicação ao fisco, sem indenização, de bens pertencentes a outrem, em decisão judicial ou decisão administrativa, com base em lei.
Manoel Gonçalves Ferreira Filho define confisco da seguinte forma: em sentido estrito, há confisco sempre que o proprietário de um bem o perde, em benefício do Poder Público, sem a justa indenização” (14).

Ao ingressar na seara do confisco, o Estado está também ferindo o princípio da capacidade contributiva para o caso em apreço, ao aplicar a multa de R$ 5.000,00 para cada mês ou fração em atraso no envio da escrituração fiscal digital.

Claramente a desproporcionalidade de tal sanção é com certeza confiscatória, vejamos em breves e claras a lição de Hugo de Brito Machado Segundo:

“O verdadeiro limite ao poder de aplicar multas é a proporcionalidade que deve haver entre o montante da multa e a gravidade da infração praticada. Infrações leves, havidas no âmbito de operações não tributadas, que não causam prejuízos ao Erário, por exemplo, não devem ser punidas com multas pesadas em função da desproporção entre a infração e a multa, e não por conta do suposto caráter “confiscatório” destas” (15).

José Osvaldo Casás no tocante no não ao confisco nos presta a seguinte lição:

“A amplitude do direito de propriedade deixa clara a sua incompatibilidade com a tributação confiscatória. Nossa Constituição consagra em seu art. 14 o direito de usar e dispor da propriedade, erigindo uma verdadeira cidadela de proteção desse direito através do art. 17, o qual, nas palavras da Corte Suprema de Justiça da Nação, “compreende todos os interesses apreciáveis que um homem possa possuir fora de si mesmo, fora de sua vida e de sua liberdade.
Em tais condições, de nada valeria que a Constituição garantisse a propriedade privada, seu uso e disposição, enquanto por via indireta a tributação esvaziasse de conteúdo efetivo o apontado direito, o qual permitiu ao nosso Supremo Tribunal federal desqualificar gravames com efeitos ou alcances confiscatórios que absorvam uma parte substancial da renda ou do capital, além do que a proibição da confiscação de bens, tal como referida no Estatuto Supremo, se acha vinculada unicamente às sanções de tipo penal que perseguem tais fins” (16).

Contribuindo com o já enunciado, trago à baila algumas manifestações do STF:

“O Poder Público, especialmente em sede de tributação, não pode agir imoderadamente, pois a atividade estatal acha-se essencialmente condicionada pelo princípio da razoabilidade, que traduz limitação material à ação normativa do Poder Legislativo. O Estado não pode legislar abusivamente.
A atividade legislativa está necessariamente sujeita à rígida observância de diretriz fundamental, que, encontrando suporte teórico no princípio da proporcionalidade, veda os excessos normativos e as prescrições irrazoáveis do Poder Público.
O princípio da proporcionalidade, nesse contexto, acha-se vocacionado a inibir e a neutralizar os abusos do Poder Público no exercício de suas funções, qualificando-se como parâmetro de aferição da própria constitucionalidade material dos atos estatais. A prerrogativa institucional de tributar, que o ordenamento positivo reconhece ao Estado, não lhe outorga o poder de suprimir (ou de inviabilizar) direitos de caráter fundamental constitucionalmente assegurados ao contribuinte. É que este dispõe, nos termos da própria Carta Política, de um sistema de proteção destinado a ampará-lo contra eventuais excessos cometidos pelo poder tributante ou, ainda, contra exigências irrazoáveis veiculadas em diplomas normativos editados pelo Estado.” (ADI 2.551-MC-QO, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 2-4-2003, Plenário, DJ de 20-4-2006.)”

Trago para apreciação algumas ementas do STF no que tange à multa confiscatória:

“AI 830300 AgR-segundo / SC – SANTA CATARINA
SEGUNDO AG.REG. NO AGRAVO DE INSTRUMENTO
Relator(a): Min. LUIZ FUX
Julgamento: 06/12/2011 Órgão Julgador: Primeira Turma
Publicação
ACÓRDÃO ELETRÔNICO
DJe-036 DIVULG 17-02-2012 PUBLIC 22-02-2012
RDDT n. 200, 2012, p. 167-170
Parte(s)
RELATOR : MIN. LUIZ FUX
AGTE.(S): HSBC BANK BRASIL S/A – BANCO MULTIPLO
ADV.(A/S) : LUIZ RODRIGUES WAMBIER E OUTRO(A/S)
AGDO.(A/S) : MUNICÍPIO DE TUBARÃO
PROC.(A/S)(ES) : PROCURADOR-GERAL DO MUNICÍPIO DE TUBARÃO
Ementa
Ementa: SEGUNDO AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. ISS SOBRE ARRENDAMENTO MERCANTIL. VALOR DA MULTA. INTERPRETAÇÃO DE NORMA LOCAL. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 280/STF. MATÉRIA INFRACONSTITUCIONAL. OFENSA REFLEXA. 1. A violação indireta ou reflexa das regras constitucionais não enseja recurso extraordinário. Precedentes: AI n. 738.145 – AgR, Rel. Min. CELSO DE MELLO, 2ª Turma, DJ 25.02.11; AI n. 482.317-AgR, Rel. Min. ELLEN GRACIE, 2ª Turma DJ 15.03.11; AI n. 646.103-AgR, Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA, 1ª Turma, DJ 18.03.11. 2. A ofensa ao direito local não viabiliza o apelo extremo. 3. Os princípios da legalidade, do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório, da motivação das decisões judiciais, bem como os limites da coisa julgada, quando a verificação de sua ofensa dependa do reexame prévio de normas infraconstitucionais, revelam ofensa indireta ou reflexa à Constituição Federal, o que, por si só, não desafia a abertura da instância extraordinária. 4. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal firmou-se no sentido de que é aplicável a proibição constitucional do confisco em matéria tributária, ainda que se trate de multa fiscal resultante do inadimplemento pelo contribuinte de suas obrigações tributárias. Assentou, ainda, que tem natureza confiscatória a multa fiscal superior a duas vezes o valor do débito tributário. (AI-482.281-AgR, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, Primeira Turma, DJe 21.8.2009). 5. A decisão judicial tem que ser fundamentada (art. 93, IX), ainda que sucintamente, mas, sendo prescindível que a mesma se funde na tese suscitada pela parte. Precedente: AI-QO-RG 791.292, Rel. Min. Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, DJe de 13,08.2010. 6. In casu, o acórdão recorrido assentou: PROCESSUAL CIVIL – PROVA PERICIAL – DESNECESSIDADE. “Como o destinatário natural da prova é o juiz, tem ele o poder de decidir acerca da conveniência e da oportunidade de sua produção, visando obstar a prática de atos inúteis ou protelatórios (art. 130 do CPC), desnecessários à solução da causa. Não há que se falra em cerceamento de defesa pelo indeferimento de prova pericial, vês que, a par de oportunizados outro meios de prova, aquela não se mostre imprescindível ao deslinde do litígio” (AI n. 2003.010696-0, Des, Alcides Aguiar). TRIBUTÁRIO – ISS – OPERAÇÃO DE LEASING SOBRE BENS MÓVEIS – LEASING FINANCEIRO – INCIDÊNCIA – SÚMULA 8 DO TJ/SC. A ter da Súmula 18 deste Pretório, restou pacificado o entendimento de que “o ISS incide na operação de arrendamento mercantil de coisas móveis”. ISS – LEASING – BASE DE CÁLCULO – VALOR EXPRESSO NO CONTRATO ACRESCIDO DE ENCARGOS PRESUMIDOS – IRREGULARIDADE. “A base de cálculo do ISS é o valor da prestação de serviços. Em se tratando de leasing, é o quantitativo expresso no contrato” (Edcl nos Edcl no AgRg no Ag n. 756212, Min. José Delgado), motivo pelo qual há que se reconhecer a manifesta irregularidade da inclusão de encargos “presumivelmente contratados” no quantum arbitrado pelo Fisco municipal. CONSTITUIÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO – MUNICIPIO – LOCAL DA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. Em relação à questão do local competente para o lançamento e recolhimento do ISS, está pacificado nos tribunais pátrios o entendimento de que “competente para a instituição e arrecadação do ISS é o Município em que ocorre a efetiva prestação do serviço, e não o local da sede do estabelecimento da empresa contribuinte” MULTA FICAL – NÃO PAGAMENTO DO DÉBITO – PRINCÍPIO DA VEDAÇÃO DE CONFISCO – INAPLICABILIDADE. 1. A imposição da multa pelo Fisco visa à punição da infração cometida pelo contribuinte, sendo a graduação da penalidade determinada pela gravidade da conduta praticada. Desse modo, afigura-se possível em razão da intensidade da violação, a imposição da multa em valor superior ao da obrigação principal. 2. Na ausência de critérios legais objetivos para fixação da pena de multa, a aplicação desta no patamar máximo deverá necessariamente vir acompanhada dos fundamentos e da motivação que a justifique. 7. Agravo regimental desprovido.”

“AI 715058 AgR / MG – MINAS GERAIS
AG.REG. NO AGRAVO DE INSTRUMENTO
Relator(a): Min. JOAQUIM BARBOSA
Julgamento: 27/03/2012 Órgão Julgador: Segunda Turma
Publicação
ACÓRDÃO ELETRÔNICO
DJe-078 DIVULG 20-04-2012 PUBLIC 23-04-2012
Parte(s)
RELATOR: MIN. JOAQUIM BARBOSA
AGDO.(A/S) : ESTADO DE MINAS GERAIS
ADV.(A/S): ADVOGADO-GERAL DO ESTADO DE MINAS GERAIS
AGTE.(S) : DELANO SHOPPING PAMPULHA LTDA
ADV.(A/S) ROBERTA ESPINHA CORRÊA
Ementa: AGRAVO REGIMENTAL. TRIBUTÁRIO. MULTA CONFISCATÓRIA. 50% DO VALOR DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. FALTA DE PREQUESTIONAMENTO. NECESSIDADE DE REABERTURA DA INSTRUÇÃO PROBATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE. Esta Suprema Corte firmou orientação quanto à possibilidade do controle de constitucionalidade das multas desproporcionais, isto é, que tenham efeito confiscatório sem justificativa. A questão de fundo, portanto, é saber-se se a intensidade da punição é ou não adequada à gravidade da conduta da parte agravada. Porém, a então recorrente não indicou com precisão a conduta que teria deflagrado a imposição da multa nem as razões pelas quais essa penalidade seria inadequada à gravidade da infração. Tampouco o acórdão recorrido demonstra esse juízo. Falta ao quadro o imprescindível prequestionamento. Assim, para que fosse possível reformar o acórdão recorrido conforme pleiteia a agravante, não bastaria requalificar fatos jurídicos. Seria necessário reabrir a própria instrução probatória, o que não é admitido (Súmula 279/STF). Agravo regimental ao qual se nega provimento.”

VI – Princípio da capacidade contributiva do contribuinte

É inquestionável que o sentido de justiça de certa forma se confunde com o sentido da capacidade contributiva. Esta ligação é claro que advém de que a tributação deve respeitar a dignidade, ou melhor dizendo, a capacidade de ser tributado. Não pode o contribuinte, pessoa física ou jurídica, sofrer sanção tributária, mesmo a acessória, onde esta exação fira este direito constitucional, conforme art. 145, §1º da Constituição Federal:

“Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos:
(…)
§ 1º – Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte” (17).

Este importantíssimo princípio traz em si o princípio da razoabilidade, princípio este já anteriormente abordado.

O princípio da capacidade contributiva determina a equitativa reparação dos encargos tributários entre os contribuintes. Vejamos o que leciona Roque Antônio Carrazza:

“Deste dispositivo constitucional emerge, de modo inequívoco, a necessária correlação entre os impostos e a capacidade contributiva. De um modo bem amplo, já podemos adiantar que ela de manifesta diante de fatos ou situações que revelam, prima facie, da parte de quem os realiza ou neles se encontra, condições objetivas, para, pelo menos em tese, suportar a carga econômica desta particular espécie tributária.
A par disso, a própria interpretação das normas tributárias que visam a onerar financeiramente os contribuintes deve ser feita em perfeita sintonia com os princípios da capacidade contributiva e da igualdade” (18).

Como sempre se demonstra, Hugo de Brito Machado leciona com grande esmero, vejamos:

“Sustenta que a capacidade contributiva não pode ser identificada na pura e simples capacidade econômica do sujeito passivo da tributação. É problemática a determinação da capacidade econômica, tanto porque é impreciso o conceito de renda, como porque a capacidade econômica não pode ser dimensionada apenas pela renda, seja qual for a noção desta que se tenha adotado. A capacidade contributiva, no seu entender, há de envolver fato indicativo do gozo de vantagens decorrentes dos serviços público” (19).

Alexandre de Moraes nos presta a seguinte lição:

“Ser for da índole constitucional do imposto, ele deverá obrigatoriamente ter caráter pessoal e ser graduado de acordo com a capacidade econômica do contribuinte. Ou, melhor: se a regra matriz do imposto (traçada pela CF) permitir, ele deverá necessariamente obedecer ao princípio da capacidade contributiva” (20).

Não nos resta outra conclusão à extrairmos dos enunciados de que tal multa, objeto deste, é totalmente confiscatória, pois não guarda nenhuma relação com a capacidade contributiva do contribuinte, tratando milhares de empresas em situações totalmente distintas no tocante à atividade, ao porte e faturamento de forma semelhante, aplicando-se a multa de R$ 5.000,00.

Lembrando ainda, conforme já tratado neste, a aplicação da famigerada multa é sem sombra de dúvida confiscatória e fere o princípio do direito à propriedade e da razoabilidade.

VII – Conclusão

A RFB ao tentar receber as multas aplicadas sem sombra de dúvida encontrará resistência dos contribuintes, mas em sua grande maioria, encontrará contribuinte que não possui capacidade financeira para pagamento da famigerada sanção.

Não seria mais vantajoso ao fisco (RFB) cobrar uma sanção com mais justiça fiscal, onde o valor da sanção fosse em virtude do porte e faturamento da empresa? Qual será a vantagem em aplicar uma sanção que acaba por sufocar a empresa?

Tal sanção não há consonância com os basilares princípios enumerados no decorrer do presente trabalho.

Não resta dúvida de que o SPED trará além de maior controle do fisco (Federal, Estadual e Municipal) dos valores de contribuições e demais outras informações. Este é o poder-dever do Estado, pois tem a obrigação de fiscalizar os contribuintes.

Não estou aqui defendendo o retrocesso do processo fiscalizatório, do uso tão somente dos meios em papel pela fiscalização. Os meios eletrônicos utilizados pelo fisco devem continuar e que a modernização é indispensável.

O que não há que ser aceito é que para a modernização dos meios de fiscalização o fisco (RFB) aplique sanções aos contribuintes que atrasem o envio do arquivo da escrituração digital, e esta sanção fira os princípios que representam a manutenção da sociedade democrática, estabelecendo o mínimo de convívio social entre o fisco e os contribuintes.

Do exposto, lança-se o seguinte questionamento: com qual base o fisco aplica uma sanção pelo atraso no envio do arquivo da escrituração fiscal digital de R$ 5.000,00 a um contribuinte que tem faturamento mensal de R$ 3.000,00 e a mesma sanção a uma empresa que tem um faturamento mensal de R$ 500.000,00?

Conforme demonstrado, através da melhor doutrina existente assim como pelo judiciário, em sendo o contribuinte compelido a pagar a malfadada sanção poderá socorrer-se ao judiciário para que analise o caso concreto e desconstitua tal sanção.

Notas

(01) Decreto nº 6.022/2003.

(02) Instrução Normativa RFB, nº 1.252/2012.

(03) BRASIL. “Constituição (1988).” Constituição da República Federativa do Brasil. 05 de Outubro de 1988.

(04) CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 19ª. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, p. 18.

(05) CASTRO, Alexandre de Barros. Procedimento Administrativo Tributário: Teoria e Prática. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 146.

(06) MORAES, a. d. (2011). Constituição do Brasil Interpretada e Legislação Constitucional (8ª ed.). São Paulo: Atlas. p. 722.

(07) MORAES, a. d. (2011). Constituição do Brasil Interpretada e Legislação Constitucional (8ª ed.). São Paulo: Atlas. p. 722.

(08) BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo. 28ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2010. p. 109.

(09) SABBAG, Eduardo de Moraes. Manual de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 208.

(10) Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.

(11) MORAES, a. d. (2011). Constituição do Brasil Interpretada e Legislação Constitucional (8ª ed.). São Paulo: Atlas. p. 190.

(12) MACHADO, H. d. (2009). Direitos Fundamentais do Contribuinte e a Efetividade da Jurisdição. São Paulo: Atlas. p. 134.

(13) Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.

(14) MORAES, a. d. (2011). Constituição do Brasil Interpretada e Legislação Constitucional (8ª ed.). São Paulo: Atlas. p. 1.715.

(15) SEGUNDO, H. d. (2009). Código Tributário Nacional, Antotações à Constituição, ao Código Tributário Nacional e às Leis complementares 87/1996 e 116/2003. (2ª ed.). São Paulo: Atlas. p. 43.

(16) MACHADO, H. d. (2009). Direitos Fundamentais do Contribuinte e a Efetividade da Jurisdição. São Paulo: Atlas. p. 136.

(17) Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.

(18) CARRAZZA, R. A. (2012). Curso de Direito Constitucional Tributário (28ª ed.). Sao Paulo: Malheiros. p. 96.

(19) MACHADO, H. d. (2009). Direitos Fundamentais do Contribuinte e a Efetividade da Jurisdição. São Paulo: Atlas. p. 85.

(20) MORAES, a. d. (2011). Constituição do Brasil Interpretada e Legislação Constitucional (8ª ed.). São Paulo: Atlas. p. 1.688.

Fonte: FiscoSoft

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